Autoral.

Carta de uma astronauta

Anna Beatriz Rodrigues
2 min readAug 5, 2024

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Um corpo estranho no universo.
Lançada para fora de minha mancha habitável, pelo indomável espírito humano, em direção ao tudo-nada. Boiando na vastidão como um dia boiei no líquido amniótico do interior de minha mãe.
Filha devota da pedra onde lateja tanta vida, me sinto tão estranha quanto estrangeira nesse vácuo onde não pulsa sangue quente. Antes de me catapultar para o mais incógnito dos mistérios, ponderei onde minha saudade sangraria primeiro. Tentei adivinhar qual seria o maestro de meu suspiro estreante.
Ah, Mãe Terra, você é, como te anseio. Aqui, onde meus sentidos se atrofiam pela carência de sons, cheiros, cores e sabores, eu choro melancólica desejando ser engolida em tua grandeza.
Mal posso esperar para voltar, e encher meus pulmões em máxima capacidade com teu aroma petricor. Mal posso esperar para voltar, e misturar minhas lágrimas de devoção ao orvalho em tuas folhas. Mal posso esperar para voltar, e tocar suas águas correntes, lançar em meu rosto teu frescor. Mal posso esperar para voltar, e ouvir tuas composições de pássaros e de maresia. Mal posso esperar para voltar, e ser transplantada de volta ao corpo de que sou parte.
Murcho lentamente no exílio, sem tua calidez buliçosa me alimentando com a vida. Mal posso esperar para voltar, Mãe Terra.

-De sua filha.

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Anna Beatriz Rodrigues

Fascinada pela vida, o vivo e o viver desde que percebeu existir, se tornou bióloga. Descobriu que o fascínio era paixão, se tornou poeta. (ig: @anna.rodds)